Açores – Arquipélago Mágico

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E no meio de um inverno, eu finalmente
aprendi que havia dentro de mim
um verão invencível.
                                      Albert Camus

Quando os dias começam a diminuir nos Açores, já o norte da Europa tirita de frio. Os verões açorianos começam cada vez mais tarde mas o bom tempo prolonga-se também por muito mais tempo. Até ao verão de S. Martinho, podemos sempre contar com muitos dias de sol que alternam com a chuva e os nevoeiros que fazem parte integrante do nosso clima.

A instabilidade será a tónica dominante do clima açoriano. Mas este parâmetro não pode nem deve, por si só, definir os Açores. Estas ilhas não são ilhas para vender como ilhas de céu azul e praia. Esta componente não é suficientemente duradoura para podermos contar com ela quando se negoceiam pacotes turísticos para as nossas ilhas.
Mas, se é verdade que o clima é instável, não é menos verdade que os Açores gozam do privilégio de poder oferecer férias de sonho em qualquer época do ano porque, se a imprevisibilidade é uma característica ilhoa, não é menos verdade que não se ouve falar aqui de catástrofes atmosféricas que coloquem em risco a vida das pessoas.
A chuva alimenta e fortalece o nosso verde. Sem ela, a exuberância dos nossos vales não existiria. Andar à chuva pode ser uma experiência maravilhosa se a quisermos ver como uma massagem natural ao rosto e ao corpo. Nalgumas ilhas, a chuva confere aos caudais uma beleza impossível de observar no verão. É também a chuva que aumenta as lagoas, que dá de beber às flores e rega toda a vegetação. Água é vida!
Enquanto nalguns países, a neve faz parar a vida das pessoas durante meses, matando toda a vegetação e colocando a zeros toda a energia das estações anteriores, nas ilhas o inverno é um tempo de revitalização da natureza, um tempo de apaziguamento, tão fundamental nas nossas vidas. Fazer trilhos no inverno, bebendo dessa experiência telúrica de sentir a natureza apaixonada por si mesma, é apaixonante.

Todos temos necessidade de retiros de silêncio, de momento de encontro connosco, de pacificação interior. O inverno dos Açores proporciona um encontro único com a metamorfose da terra, com a energia vibrante do vento e com a solidão consentida do mar bravo.

Algumas das mais importantes festividades açorianas acontecem nessas estações mortiças em que temos tempo para estar uns com os outros: a matança do porco tradicional, o fumeiro das linguiças, os jogos de cartas e as histórias contadas ao serão, por quem sabe.

O folclore, as danças tradicionais, a viola da terra e a chamarrita…

O carnaval da Graciosa, os Bailhinhos da Terceira, os bailes do Coliseu, as Carvalhadas de S. Pedro, as passagens de ano aqui e além, o Espírito Santo intemporal, a meditação, o ioga, o reiki ou os retiros de silêncio.

O chá da Gorreana bebido em qualquer ilha com queijadas da Graciosa ou biscoitos de orelha de Santa Maria. Um Lajido do Pico é aperitivo para tomar na companhia de amigos com alguma coisinha da Pérola da Ilha para petiscar pelo meio. Um naco de queijo de S. Jorge ou do Corvo com uma angelica podem ser também uma opção de bom começo. Queijo de S. Jorge com compotas do Quintal dos Açores, bolos lêvedos com manteiga de alho ou massa sovada com carne assada. Tudo como manda a tradição das nossas ilhas. Para saborear lentamente e sem pressa, sem os apelos inquietantes do mar de calmaria ou de um pôr-do-sol fascinante. Tudo para sentir na intimidade de um encontro sem tempo, aquecido pela conversa amena das longas noites de inverno.

A gastronomia de inverno é mais rica e mais elaborada. Workshops de pão caseiro cozido em forno de lenha para crianças e adultos, seguido de serões de poesia ou jogos tradicionais podem garantir um enriquecimento cultural incrível e podem proporcionar seguramente momentos de convívio que o verão não conhece com a mesma profundidade. Comida caseira cozida em forno de lenha, conversas ao serão, prolongamentos do tempo sem tempo….

A caça ao coelho bravo, o canyoning, o golfe e o futebol de salão são atividades que podem preencher tardes de inverno em todas as ilhas.

Os Açores têm excelentes espaços culturais que não são simpáticos durante o verão, altura em que todos queremos beber do sol até ao cansaço. No inverno, são ideais para encontros de escritores, performances culturais e artísticas, conferências temáticas, apresentações públicas de projetos de interesse para todos. Podem mesmo descobrir-se em cada ilha valores escondidos, pessoas giríssimas que escondem capacidades que podem enriquecer a coletividade quando partilhadas.
Subestimar o interesse do turismo noutras estações, que não o verão, parece um erro grave. Os Açores têm muito para dar em todas as épocas.

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Gabriela Silva

Na natureza tudo é dual. E da dualidade se alimentam sonhos e projetos. Em S. Miguel, já existe um ramo do turismo holístico com créditos firmados. Mas de uma forma geral, em todas as ilhas, este é um turismo que ganha forma e conteúdo. Pode vir a ser uma das vertentes do turismo de inverno nas nossas ilhas onde jorram águas quentes e onde a instabilidade do clima também traz dias de sol em dezembro ou janeiro. O clima é apenas uma pequena parte do problema quando dentro de nós há mais nevoeiro que na natureza. Venham às ilhas de inverno todos os que têm estrelas na fronte e paz no coração.

E os milagres acontecerão em todas as ravinas…

 

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